Fazenda do Canteiro - Serra das Almas / Drº Elias

Fazenda do Canteiro: histórica propriedade do Barão das Duas Barras

A história da Fazenda do Canteiro, em Trajano de Moraes, está relacionada com a imigração de indivíduos da província de Minas Gerais para o município de Cantagalo. O mineiro João Antônio de Moraes, nascido em 1810, casa-se com a cunhada Basília Rosa da Silva, viúva de seu irmão Antônio Rodrigues de Moraes, assassinado em Cantagalo. O casamento foi realizado em 17 de agosto de 1835 na Fazenda Santa Maria do Rio Grande, onde o casal cria os dez filhos, cinco do primeiro matrimônio de Basília. O plantio do café em Cantagalo permitiu uma extraordinária expansão econômica a João Antônio de Moraes. Em razão do aumento de seu patrimônio, em 1867 obteve o título de Barão das Duas Barras. De acordo com a historiadora Marieta de Moraes a documentação relativa aos bens do Barão das Duas Barras indica que apenas 1/3 de sua fortuna correspondia a terras, escravos e pés de café. Os outros 2/3 representavam dívidas ativas, ou seja, empréstimos a outros fazendeiros ou parentes e dinheiro em caixa depositado em bancos ou nas casas comissárias. Uma série de escrituras de confissão de dívida emprestando dinheiro a juros comprova a sua atividade usurária.

O primeiro Barão das Duas Barras chegou a possuir 22 fazendas. Além de Santa Maria do Rio Grande, berço dos Moraes e a Fazenda do Canteiro, objeto deste artigo, possuía Macabu, Barra, Bonança, Boa Esperança, Coqueiro, Córrego Alto, Engenho da Serra, Engenho Velho, Freijão, Glória, Grama, Monte Café, Neves, Olaria, Paraíso, Ribeirão Dourado, Sant’Alda, São Lourenço, Sobrado e Rio São João, em Minas Gerais. Em virtude da Lei de 1850, conhecida como Lei Euzébio de Queiroz, que abolia o tráfico intercontinental de escravos, torna-se evidente que o trabalho realizado por cativos estava na iminência de terminar no Brasil. O Barão das Duas Barras foi um dos poucos fazendeiros que se preparou para o fim da escravidão. Libertou antecipadamente seus escravos dando-lhes pés de café e glebas de terras na Fazenda Santa Maria do Rio Grande. Com o fim da escravidão garantiu com este gesto, a manutenção dos libertos em suas propriedades trabalhando como camaradas. Por isto, de acordo com a memória familiar, se diz que nas fazendas dos Moraes, os escravos não abandonaram as lavouras de café. Agiu com muita astúcia, pois o segundo Barão de Cantagalo faliu porque os libertos abandonaram as lavouras de café de suas fazendas, perdendo a colheita.

Em toda a sua vida, o primeiro Barão das Duas Barras teve costumes patriarcais mineiros. A sua mesa era frugal e abundante, nela havendo regularmente canjica, pipocas, couve, caldo de unto e rapadura. Não ocupou cargos públicos, não mandou fazer um brasão da família e não teve louças e cristais com o seu monograma, um costume da época entre a nobreza da terra. No máximo teve um aparelho de chá de prata gravado com suas iniciais e fez-se retratar, assim como à baronesa. O barão faleceu no ano de 1883 e sua esposa Brasília no ano seguinte. Em seu testamento pediu para ser sepultado no cemitério da Fazenda Santa Maria do Rio Grande e o seu corpo transportado pelos escravos mais velhos.  Depois de sucessivas transmissões hereditárias, o último herdeiro Fazenda do Canteiro, entre os Moraes foi Flávio Linch. Em 1983, Linch vende a fazenda ao casal Roberto Wellem Etz e Teresa Cristina Vieira Machado Etz.

A casa-sede da Fazenda do Canteiro é de pau-a-pique tendo recebido intervenções ao longo dos anos que alteraram a sua volumetria, bem como a divisão interna dos ambientes. O antigo terreiro de secagem de café, cercado por um espesso muro de pedra permite o vislumbre perspectivo do casarão. Adjacentes ao terreiro estão a tulha e a usina. Possui ainda palmeiras imperiais e um pomar como área de transição entre a mata e a área edificada. Ao fundo está a reserva florestal de cerca de 50 hectares, que envolve toda a propriedade, implantado em um vale para onde convergem as águas que provêm dos morros circundantes, garantindo um microclima diferenciado. Tem grande destaque na fazenda o aqueduto do século 19, pelo qual passa a água vinda dos morros, que movimentava os engenhos e a roda d´água. Próximo à casa-sede está localizado o moinho para a fabricação de farinha de fubá e da canjiquinha, que ainda conserva a pedra açoriana.

A roda d’água permanece em seu local de origem e tem plenas condições de funcionamento, bem como toda a canalização do aqueduto necessária para mover a roda. A captação de água se fazia nos morros mais altos, atrás da mata, sendo coletada de nascentes através de uma banqueta. A água desce pelas canaletas de pedra atravessando a mata, até atingir o lago de piscicultura e o antigo tanque de lavagem de café, de onde segue para percorrer o aqueduto. Foram construídos açudes na fazenda para garantir a reserva de água nos períodos de estiagem. Quando a água do açude transborda, ela é coletada para o antigo sistema de banquetas refazendo todo o percurso existente há mais de um século.

A Fazenda do Canteiro vai do pequeno povoado de Barra do Canteiro até a Serra das almas. A terra é fértil sendo denominada de argila arenosa. Ao longo do caminho é possível observar o relevo acidentado que caracteriza a paisagem da região. Ocasionalmente nos deparamos com imensos paredões rochosos. Pelas encostas escorrem expostas abundantes quedas d’águas provenientes das nascentes e lençóis aquíferos, os quais alimentam os rios e córregos da região, como o Córrego das Neves. A atividade econômica da propriedade é o cultivo de variados tipos de frutas, notadamente da goiaba, legumes e hortaliças, pecuária de corte, enfim o agronegócio. A topografia da região serrana fluminense, com muitos morros e poucas várzeas, não permite a mecanização, e por isso, os agricultores dependem muito da mão-de-obra que está cada vez mais difícil. A falta de braços na lavoura sempre foi um problema na história agrária do Brasil. Para uma atividade agrícola em alta escala somente o sistema de parceria, como a meação, tem logrado êxito.

A paisagem da Fazenda do Canteiro é de uma beleza extraordinária e quase não se vê erosão nos morros provocado pelo antigo sistema predatório de plantio do café, que não fazia uso do sistema de curva de nível. A boa notícia é que a Fazenda do Canteiro está aberta à visitação. Recebe hóspedes em aconchegantes bangalôs ou com visita programada no sistema Day Use. A tradicional feijoada no fogão a lenha com caipirinha, cuja cachaça é produzida na Canteiro é oferecida ao visitante. O visitante poderá percorrer trilhas nos arredores da fazenda se deparando ainda com arbustos centenários de café. Além de se desfrutar de uma atmosfera histórica pode-se conhecer uma propriedade em plena atividade produtiva. Mais informações podem ser obtidas com Gustavo Etz pelo telefone (22) 98110-2783.





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